Por Moisés Sbardelotto
Libanio, 79 anos, afirmou que, em seu livro, não buscou dizer que o jovem é "assim". "Como é que um velho pode falar isso?", brincou. E esclareceu que "juventude" não tem a ver apenas com a questão biológica: "Há muito homem de 40 anos com atitudes juvenis", explicou. Sua obra, portanto, busca fazer uma análise histórico-crítica da juventude, baseado não tanto em bibliografias, mas sim em sua própria experiência de vida, tendo passado por pelo menos três gerações. "Eu não digo onde os jovens estão. Apenas questiono: será que realmente caminhamos nessa direção?", comentou. E frisou: "São tendências. A gente pode mudá-las".
Das 46 tendências da juventude apontadas no livro, Libanio apresentou ao longo de sua palestra pouco mais de uma dezena. Começando por uma tendência mais biológica: de um crescimento e desenvolvimento físicos lentos (devido a uma alimentação mais fraca, com esportes mais reduzidos), passa-se a uma juventude com um desenvolvimento físico rápido. "Mas o psíquico não pode acompanhar esse crescimento. Não se pode acelerar a psique", afirmou o teólogo. "O jovem se sente muito grande de corpo, mas não sabe o que fazer com ele. A alma não cabe mais lá dentro, não o preenche. Muito corpo e pouca alma. O que acontece? O espaço que a alma não preenche vira defunto – os jovens têm uma parte mais 'defúntica'", ilustrou.
Partindo da definição de corpo de outro jesuíta, Henrique Cláudio de Lima Vaz, ou seja, como presença no mundo, maneira de se fazer presente ao mundo, Libanio afirmou que, "por crescer muito, o jovem não se dá conta dessa presença. E o que acontece? Ou vem a timidez ou representamos, fazemos muito teatro na vida", comentou, exemplificando com algumas atitudes consideradas como "rebeldes" dos jovens. "É muito comum os jovens fazerem teatro sem se dar conta. É a dificuldade de estar presente ao mundo", explicou.
Projeção e exploração
Por outro lado, Libanio trouxe para o público presente – mais de 200 pessoas – uma conceituação de duas dimensões da vida: a projetiva e a explorativa, que também se manifestam claramente na juventude. A dimensão explorativa, explicou, leva a fazer a experiência e a perceber a realidade. Já a dimensão projetiva aborda o que eu serei amanhã, e controla e reduz a dimensão explorativa. Para ele, "o jovem está diminuindo a dimensão projetiva". Comparando a "geração Dilma", a geração de 1968 que "viveu extremamente o projetivo" (as lutas por um Brasil socialista, diferente, contra o regime) e sacrificou o seu presente, a juventude contemporânea manifesta uma tendência a diminuir o mundo projetivo, vivendo sem futuro, sem esperanças. "Usufrui-se só o presente, e o futuro é entregue às traças", comentou.
Além disso, segundo o teólogo, há uma tendência de um deslocamento de uma afetividade mais de recepção dos maiores para uma afetividade mais narcisista. "A geração anterior tinha muito interesse em aprender dos mais velhos, sede de aprender de quem já tem uma tradição, uma história. A história tinha uma certa importância", explicou. Hoje, porém, diante da "cultura Google", "qualquer coisa está simultaneamente diante de mim". E, de acordo com Libanio, "a cultura do simultâneo me dá a ideia de que não há mais história, só há informação". Sai de cena a progressividade cultural e entra a simultaneidade de todas as coisas são simultâneas, o "presentismo". Assim, a juventude passa a pôr de lado o aprendizado com a tradição, "valorizando só o que se aprende momentaneamente. Não me interessa mais saber dos antigos. Aprendemos só do presente", comentou Libanio.
Isso leva também à tendência de uma felicidade sólida e permanente às felicidades momentâneas. E Libanio exemplificou a partir da questão da afetividade: antes, comentou, os jovens namoravam, palavra em cuja raiz semântica está presente o amor, "que, por natureza, quer eternidade, faz eternidade, é eternidade, como disse o teólogo Joseph Ratzinger". Hoje, ao invés, os jovens "ficam", ou seja, "é agora, começa e acaba. As felicidades não se prolongam".
Em contrapartida a uma juventude que possuía um certo medo e receio diante das experiências, passa-se a uma "busca de experiências extremas", segundo Libanio. Experiências extremas, limites, próximas da morte, como os esportes radicais, as drogas, o desrespeito no trânsito etc.
Uma outra tendência apontada por Libanio é de uma maior consciência da diferença sexual para uma possibilidade muito maior de proximidade. "A distinção entre rapazes e moças tende a diminuir. Muitos preconceitos caíram, machismos falsos desapareceram, mas, não tendo um diferente, eu sofro na minha percepção de identidade", explicou o jesuíta.
Da intimidade à "extimidade"
Isso se relaciona também ao fato de os jovens das gerações passadas serem mais pudorosos com relação à sua intimidade. Segundo Libanio, existia o lugar da confidência, geralmente a pessoas adultas, religiosas – como no caso da confissão –, lugar este que está desaparecendo. "A quem o jovem se abre? Entre si. Entre iguais, eles têm muito mais liberdade para conversar sobre seus problemas". Assim, cresce a "publicidade informática" entre os jovens, comentou Libanio, ou seja, a exposição da vida nos sites de relacionamento. Dá-se assim uma perda enorme da intimidade, passando de uma intimidade ao que alguns autores franceses chamam de "extimidade", apontou Libanio.
Mas a palestra foi apenas uma antessala para a obra, que aborda ainda diversas outras tendências percebidas pelo jesuíta também em aspectos como família, sociedade, religião. Como indicou Libanio, o livro busca ser uma análise, um olhar para essas tendências sem medo, sem clericalismo exagerado, sem julgamento: "Não é um livro moralista", resumiu. "É uma reflexão dialética – eu olho para uma tendência, vejo o que há de positivo e o afirmo, reforço. Percebo que nela há um negativo, e então o nego", explicou.
E desafiou os presentes a avançar no acompanhamento pedagógico ou pastoral da juventude mediante três passos: afirmar o positivo, negar o negativo e criar o novo. "Sem fantasia, nós não avançamos", disse Libanio, recordando um dos slogans dos jovens do maio de 1968: "A fantasia no poder".
Fonte: Instituto Humanitas Unisinos
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