O sociólogo Mark Regnerus, bastante criticado, fala sobre seus mais recentes estudos sobre famílias com casais homossexuais.
Se quiser
saber como foram os últimos meses do sociólogo da Universidade do Texas, Mark
Regnerus basta ler a última edição da revista conservadora Weekly Standard. Na
capa da edição de julho da revista há dois capangas encapuzados girando
maliciosamente uma roda de tortura medieval onde Regnerus está preso, suando em
bicas tentando se manter inteiro. O verso da página – “A vingança dos
sociólogos: os perigos das pesquisas acadêmicas politicamente incorretas” –
sugere a situação provocada pela publicação da mais nova pesquisa de Mark
Regnerus, assim como um discurso político mais amplo a respeito do casamento
homossexual.
O relatório,
conhecido como New Family Structure Studies (NFSS) (“Estudos sobre a Nova
Estrutura Familiar”) é notável em seu escopo. Trata-se de uma amostra nacional
aleatória considerada o “padrão de ouro” das pesquisas de ciências sociais. O
NFSS mede os efeitos econômicos, políticos e psicológicos em jovens adultos, de
18 a 39 anos, que cresceram em famílias onde ou o pai ou a mãe se envolveram em
relações homossexuais. Apesar da cautela demonstrada por Regnerus ao afirmar
repetidas vezes que o NFSS não leva em conta casamentos estáveis do mesmo sexo
(já que casamentos do mesmo sexo não existiam quando esses entrevistados eram
crianças), ele tem sofrido censura profissional. O Social Science Research está
realizando uma auditoria interna sobre o processo de revisão do NFSS, e a
Universidade do Texas, em Austin, está investigando as alegações feitas por
Regnerus de “má conduta científica”.
Regnerus
aceitou conceder uma entrevista por e-mail a Christianity Today para esclarecer
os fatos a respeito da NFSS e seus dissabores.
Outros estudos foram feitos a respeito do bem-estar de
crianças criadas por casais do mesmo sexo com a conclusão de alguns sociólogos,
de que não há diferença entre estas e aquelas criadas por casais
heterossexuais. Por que foi necessária a presença do NFSS dessa vez?
A maioria dos
estudiosos da família havia, até recentemente, afirmado de maneira consistente
a elevada estabilidade e as vantagens (para as crianças) de um ambiente
familiar constituído por pais biológicos casados e heterossexuais, em contraste
com todos os outros “modelos” de família. Outros tipos de arranjos familiares
não atingiram níveis desejados de desenvolvimento, como a realização
educacional, e apresentaram problemas de comportamento e bem-estar emocional.
Para os
filhos de lésbicas e gays americanos, no entanto, os cientistas sociais parecem
ter mudado de opinião radicalmente. Desde 2001, e em maior escala atualmente,
estudiosos têm declarado cada vez mais que “não há diferença” entre pais
heterossexuais ou homossexuais, e alguns inclusive sugerem que pais do mesmo
sexo podem ser até mais competentes do que um homem e uma mulher em um arranjo
familiar tradicional. Dez anos é muito pouco tempo para derrubar um paradigma
tão estável, e, francamente, alguns de nós consideramos isso um tanto suspeito,
e, portanto, decidimos pesquisar a respeito nós mesmos.
Acredito que
o único componente sensível ao tempo nesse estudo, é o fato de que era o
momento de avaliar o que se tornou uma drástica mudança de consenso sobre o
assunto.
Como a metodologia utilizada em sua pesquisa se compara
com aquelas usadas em pesquisas anteriores sobre este tema?
Esta é a
principal área de distinção entre meu estudo e os outros. Quase todos os
estudos feitos antes desse eram pequenos e “não-aleatórios”. Isto é, não temos
a menor ideia do quão semelhantes à maioria dos participantes dos outros
estudos são à população que eles procuram estudar. E em relação a vários
estudos anteriores, acredito que haja motivos para o ceticismo. Por exemplo, se
você sabe que está participando de um pequeno estudo sobre paternidade gay, e
que isso será notícia e que talvez tenha ramificações políticas, acredito que
seja justificável o questionamento de estudiosos sobre a validade dos dados.
O NFSS, por
outro lado, é muito maior do que a maioria dos outros, e trata-se de uma
amostra aleatória da população americana entre as idades de 18-39 anos. Não me
concentrei na orientação sexual dos pais – afinal de contas, era uma época
bastante diferente – mas no comportamento deles nos relacionamentos. Comparei
então, como jovens adultos cujos pais ou mães se envolveram em relacionamentos
homossexuais se saíram quando comparados a outros tipos de arranjo matrimonial,
inclusive a relação tradicional e biologicamente intacta entre um pai e uma
mãe.
Explique brevemente como você identificou “mães lésbicas”
e “pais gays” no estudo. Não se tratam de casais estáveis do mesmo sexo, que
decidiram adotar ou fazer fertilização in vitro, certo?
Os dados
permitiram que surgissem casais gays e lésbicos estáveis, mas pelo menos na
época em que estou avaliando, isso não era comum. Da mesma maneira, a barriga
de aluguel e a tecnologia de reprodução assistida também não eram. São
artifícios bastante caros, ainda hoje. Outro trabalho realizado a respeito
deste assunto observa que “a literatura sobre casais do mesmo sexo tende a
apresentar estudos sobre o tipo de mulheres que podem pagar por tecnologia de
reprodução assistida: mulheres brancas, de classe média alta”. Mas esse é o
estereótipo criado pela mídia sobre pais e mães gays, embora os dados do Estudo
Nacional do Crescimento Familiar tenham revelado que estes tem menos propensão
de desejar filhos do que pais e mães gays que não sejam brancos. Então, os
tipos de casais aos quais você está se referindo, podem estar presentes nos
dados, apesar de eu não ter perguntado aos entrevistados a respeito das
circunstâncias de seus próprios nascimentos. A partir de outras perguntas –
como se suas mães e pais biológicos já foram casados alguma vez -- eu posso
arriscar um palpite sobre suas origens. A maior parte de tais entrevistados
eram produtos de uma união heterossexual que eventualmente se desintegrou.
Alguns entrevistados sugerem que tais uniões se tratavam de “casamentos de
orientação mista”, mas eu não presumiria algo assim com tanta pressa. Embora a
etiologia da homossexualidade não esteja em jogo aqui, perguntas sobre as
categorizações feitas por mim parecem levantar a questão a respeito de que
pessoas podem ser consideradas gays, sem falar de bissexualidade. O estudo, no
entanto, diz respeito ao que seu próprio título afirma: os filhos adultos de pais
que tem ou tiveram relações homossexuais. Em retrospecto, gostaria de ter me
assegurado melhor da compreensão de meus leitores a respeito disso.
O que você diria a grupos religiosos e políticos que
promovem o casamento tradicional e desejam usar os resultados do NFSS para
“provar” que a paternidade por casais do mesmo sexo é prejudicial às crianças?
Não sou nem
teólogo e nem político, então não me atreveria a dizer a ninguém como fazer seu
trabalho. Apesar das ciências sociais não serem capazes de “provar” as coisas,
elas podem descrever a realidade social. O que o NFSS descreve é que os jovens
adultos, filhos de homens e mulheres homossexuais parecem ter sido mais
propensos a problemas durante o crescimento, e, em alguns casos ainda hoje, do
que aqueles cujos pais biológicos continuam casados. O porquê disso é uma
questão importante, que deve continuar sendo explorada e discutida.
Que tipos de problemas esses jovens adultos de pais
homossexuais enfrentam exatamente? Emocionais, financeiros, espirituais?
Eles relatam
uma série de desafios, principalmente no caso de terem vivido em ambientes
familiares de muita instabilidade. Muitos tiveram a experiência de conviver com
as idas e vindas dos parceiros de seus pais ou mães. Entre outras coisas, eles
se mostraram mais aptos a enfrentar dificuldades financeiras, problemas para
arranjar emprego e terminar os estudos, assim como mais problemas com a lei.
Também relataram um número mais elevado de parceiros sexuais e vitimização do
que as crianças vindas de casamentos biologicamente intactos e estáveis.
Questões de religião e espiritualidade não foram incluídas no estudo.
Quais são suas convicções pessoais a respeito das
estruturas matrimoniais? Essas convicções tornam sua pesquisa tendenciosa, como
as recentes críticas direcionadas a você sugerem?
Todo
pesquisador tem opiniões próprias. É por esse motivo que bons projetos de
pesquisa devem assegurar o anonimato dos participantes e não sugerir o que
estes devem responder. Tal postura ajuda a permitir que as ciências sociais
superem as tendências pessoais de cada pesquisador.
Você observa que todo pesquisador tem suas próprias
convicções. De que maneira tais convicções contribuíram para informar a
auditoria interna de sua pesquisa, que está sendo conduzida atualmente pelo
Social Science Research, especificamente pelo sociólogo Darren Sherkat?
Sherkat, que apóia o casamento gay, não criticou sua pesquisa publicamente
antes do início da auditoria?
Sim. Não vou
revidar, mas é verdade. E ainda assim, a auditoria concluiu que o processo de
publicação do estudo não foi comprometido. Estudiosos se criticam mutuamente o
tempo todo, mas dessa vez parece ser algo pessoal.
Seu estudo tem algo a contribuir para a atual discussão
sobre a legalização e aceitação cultural do casamento homossexual?
O objetivo do
estudo em si não foi nem de minar e nem de afirmar qualquer tipo de direito
legal sobre o casamento homossexual. Dito isso, o NFSS e outros estudos sólidos
são uma boa fonte de orientação para os cidadãos, independente de suas
perspectivas pessoais.
Refletindo agora, você acha que, como pesquisador, foi
responsável de sua parte receber fundos para o NFSS do Instituto Witherspoon e
da Organização Nacional para o Casamento (NOM) – dois grupos conhecidos por
suas fortes convicções a respeito do casamento tradicional?
Nenhum
financiamento veio da Organização Nacional para o Casamento (NOM), e sim do
Instituto Witherspoon e da Fundação Bradley. (Nota do editor: os críticos de
Regnerus estão ligando Witherspoon e Bradley a NOM porque Robert P.George,
presidente emérito da NOM, tem fortes ligações com as duas instituições que
ajudaram no financiamento do estudo de Regnerus). Como já observei no texto
presente no estudo e em outras fontes, sempre trabalhei de forma independente
de ambas as organizações. Nenhum representante de financiamento das agências
foi consultado a respeito do projeto de pesquisa e do conteúdo da mesma, das
análises ou das conclusões. Quaisquer alegações de que os financiadores tenham
influenciado indevidamente são falsas.
Como você compreende sua vocação como sociólogo? O que a
sociologia oferece para a sociedade como um todo que outras profissões não
ofereçam?
Entre outras
coisas, a boa sociologia investiga a cultura, como as estruturas funcionam,
como determinadas formas de pensar e agir se tornam “normais”, como as
instituições moldam nossas vidas e como se dá a mudança social. Isso pode parecer
abstrato e maçante, mas é um modo fascinante e muito importante de ver e pensar
o mundo e as nossas vidas. Aqueles que se aplicam a encarar esse tipo de
questões muitas vezes se dão conta do quão interessante e importante a análise
sociológica pode ser. E, nesse processo, eles muitas vezes vêm a entender de
modo bem mais completo suas próprias experiências de vida.
Fonte: Cristianismo Hoje
Fonte: Cristianismo Hoje
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